Caxias do Sul - Rio Grande do Sul - Brasil

Diário online do ator Márcio Ramos - relatos, pensamentos, agenda, críticas...

terça-feira, 28 de maio de 2013

Grupo TEATRO SEM CORTINA


O nosso trabalho iniciou em agosto de 2012, com a proposta de uma oficina teatral voltada para a remontagem de um antigo espetáculo. Do elenco eu só havia trabalhado com um dos atores, os demais eram corpos completamente novos para mim.
Ao iniciar os trabalhos, percebi que as diferentes escolas de cada ator eram tão diversas, que seria um desafio encontrar pontos em comum para desenvolver o projeto.
Com estes novos corpos nada familiarizados uns com os outros dei início a duas esferas do trabalho - a construção de material de ator e a construção da dramaturgia da peça.
Com a preparação dos atores, busquei referências diretas com meu aprendizado durante o workshop A Arte Secreta do Ator, ministrado por Eugênio Barba. Meu objetivo era repassar cada processo vivido por mim durante o workshop, para oferecer ao elenco uma visão mais dinâmica do trabalho do ator. Alguns corpos dialogaram bem com este processo, outros necessitavam de muito mais tempo para uma assimilação verdadeira.
O tempo era curto, pois agendamos uma Mostra de Processo em novembro de 2012 e não tínhamos muito tempo disponível.
Neste momento voltei minhas atenções para os textos da peça. Os corpos em movimento dos atores me inspiraram a escrever textos novos, assim abandonando a idéia inicial de remontar um antigo espetáculo. Voltar a escrever foi um desafio, pois me questionava muito: "O que eu tenho a dizer hoje?", "O que o meu corpo quer questionar?", "Quais são minhas inquietações?" - e para minha felicidade, meu corpo não queria questionar o meu dia-a-dia, o meu cotidiano, a minha esfera. Minha mente saiu do meu local confortável e buscou inspirações em diversas vivências profundas que presenciei durante o ano de 2010 e 2011, quando eu estava trabalhando com escolas da rede municipal ministrando oficinas de teatro, em sua maioria eram escolas da periferia. Conheci muita crianças e famílias pelas quais eu me apaixonei, porém eu não podia fazer muita coisa por eles. A sensação de impotência era muito grande. Lembrei dos olhos curiosos e atentos a cada exercício proposto. Durante 50 minutos, uma vez por semana, eles tinham a oportunidade de sonhar - sonhar alto - em serem quem eles quisessem ser.
Quando dei por mim os textos já estavam prontos. Mas não havíamos chegado nem na metade de nossa jornada.
Agora com cada ator estruturando seu trabalho de pesquisa corporal em construções de maxi-partituras - unindo: corpo, voz, estados e sensações - era o momento de construir a casa, o contexto, o universo daqueles seres novos que começavam a aparecer.
Tentei umas três abordagens diferentes (o elenco cada vez mais apavorado, pois não tínhamos tempo sobrando), caímos no universo real nestes personagens.
A criação da direção geral da peça foi mais uma não-direção. A estrutura era crua e o objetivo era mostrar o trabalho dos atores, apenas.
Mostramos. Vivenciamos um primeiro contato com o público - tivemos todos os tipos de reações, opiniões positivas e negativas.
Questionei aos atores: "Querem continuar? Vamos mergulhar ainda mais neste universo, sem medo?" - todos aceitaram.
Então, em março de 2013 retomamos o trabalho com o foco na desconstrução do ator. ofereci vários caminhos para eles, como trabalhos para construção de bufões e de clown como referência. Aqui comecei a sentir realmente o surgimento do grupo.
Com estes corpos agora bem familiarizados uns com os outros, começamos a ir para a rua, transformar a cena com ambientes diferentes, estimular a capacidade de transformação imediata do ator perante o momento.
Voltamos para a sala e utilizamos uma ideia que havia surgido durante um ensaio - tentar reproduzir no nosso espaço de ensaio a ideia proposta como locação no filme "Dogville".
Desenhamos, criamos, trocamos muitas ideias e voltamos a estruturar.
Nossos últimos 3 ensaios vieram para restabelecer uma relação de necessidade com o jogo cênico destes personagens.
O que será apresentado hoje é uma parte disso.
É um ponta pé inicial para muitos coisas, muitas descobertas, muitas transformações.